Rafael Favero - Jornalista

Sou santa-mariense, mas não sei se posso me considerar um "morador raíz" da nossa cidade. Não andei de trem, nem vi a Gare funcionando. Não conheci o doutor Mariano da Rocha, fundador da UFSM, e, quando nasci, a maior parte dos cursos da instituição já estava consolidada no campus de Camobi. A reitoria da Rua Floriano Peixoto, para mim, sempre foi a antiga. Nas minhas memórias, a UFN chamava-se Unifra. Sei, pelos livros, que teve outros nomes (FIC e Facem). E, apesar do meu nascimentoter sido publicado em nota no A Razão em 1998, quando criei interesse por notícias, o jornal estava em seus últimos anos vida.

Portanto, nem de perto conheço a Santa Maria do passado como as mentes privilegiadas dos professores James Pizarro e Luiz Gonzaga Binato, por exemplo, com quem tive o prazer de manter contato na época em que cuidava da página Memória do jornal Diário. Mesmo assim, apesar de ter vivido o somente Centro em "decadência" - classificação de alguns cidadãos mais experientes -, esse espaço, que tem na Avenida Rio Branco o seu eixo principal, faz parte da minha memória afetiva de infância.

Para quem morava no Bairro Camobi, na região leste, como eu, ir até o Centro era uma viagem, principalmente para quem não tinha carro, a exemplo da minha família em determinados momentos. Fazer compras, pagar contas, passear, ir em alguma consulta médica eram necessidades que precisavam de planejamento. Inclusive, ir ao Centro significava ir "na cidade". "Vamos pegar um ônibus tal dia para ir na cidade", dizia a minha avó, verbalizando um sentimento interiorano de se sentir à margem do desenvolvimento urbano do município. Esse panorama, hoje, mudou: o aluguel em Camobi, em vários locais, está mais caro do que no Centro.

Sabe o que mais me impressionava nessas idas até o Centro? A variedade de linhas de ônibus que passavam no Paradão. "Quanto lugar diferente", pensava. Cedo, descobri que toda a cidade converge para o Centro. Para trabalhar, para consumir ou simplesmente para bater pernas, todos passam pela Rio Branco, pelo Calçadão e pela Praça Saldanha Marinho. Essa região é o coração de Santa Maria. O sangue vai e volta na direção do coração. Sem esse fluxo não há vida, nem no corpo humano, nem no município.

E é por conta desse entendimento que tenho minhas restrições com quem critica a Prefeitura pela quantidade de obras no Centro. É verdade que os bairros periféricos também têm suas necessidades, e é obrigação do Poder Público atendê-las. Mas é igualmente verdade que o Centro precisa de uma atenção maior e ali estará concentrado um grande volume de recursos. É para o Centro que a população vai, hoje, amanhã, depois ou diariamente. Portanto, investir no Centro é cuidar na cidade toda. 

Está bem estabelecido para mim, enquanto morador de Santa Maria, mesmo que ainda residindo em bairro periférico, que o Distrito Criativo Centro-Gare é um movimento acertado. Revitalizar os prédios e demais espaços históricos e criar motivos para as pessoas ocupá-los são ações complexas. Jogar uma tinta na parede, com certeza, apresenta um resultado aparente mais imediato que criar um distrito criativo. Porém, busca-se algo duradouro e não efêmero, como se viu em anos anteriores. A história de Santa Maria pedia algo novo. E é o que temos.